Sempre me inspiro em pessoas que mudam de rumo. Pra lá ou pra cá.
Pessoas que fazem o que tem vontade, independente do tempo e da hora. Pessoas
que acumulam desejos durante meses ou anos e finalmente se dão o prazer de
realiza-lo. Que descobrem uma habilidade a muito guardada e finalmente
explodem. Explodem no prazer de fazer o que sabem e gostam.
Isso me veio a cabeça ao olhar a orelha de Cinquenta tons de cinza,
falando da autora E L James. Pessoa comum, que diz ter adiado o sonho de
escrever para dedicar-se a família. Agora escreveu sua trilogia que atinge
enorme sucesso. ( Sem querer julgar aqui méritos literários). Imediatamente
penso em J K Rowling, e sua vida mais que comum até o fenômeno Harry Poter ser
posto em palavras. Hogwarts por certo deveria ser um local secreto em sua
mente, para onde ela ia para fugir do ordinário e criar seus personagens
mágicos.
Pessoas que cuidam do sonho com carinho, adubam a mente e de repente
afloram.
Penso nestas mulheres como boas mães. Não por renúncia ou desapego.
Muito mais pelo exemplo que dão por terem descoberto e seguido um dom. Afortunados
aqueles que sabem exatamente o que querem. Parece simples, mas saber o que quer
é uma arte, e depois colocar este desejo dentre os primeiros na lista de
prioridades exige imenso... Discernimento ( ainda tento achar a palavra certa).
Acima mencionei que admirava mudanças pra lá ou pra cá. Refiro-me ao
outro lado da moeda. Profissionais bem sucedidas, já muito atentas aos dons e
desejos, que voltam-se por vontade própria a família. Quase que como um
chamado, atendem ao desejo de ficar mais tempo com os filhos.
Lembro-me do meu professor de neurociência. Tenho seu discurso
guardado em canto seguro na minha memória.
Era a aula inaugural da disciplina mais temida da minha pós-graduação:
Sinapses, e ele nos surpreendeu imensamente. Não falou de neurotransmissores e
nem de correntes elétricas e sim sobre uma de suas orientandas que acabara de
concluir o doutorado. Referia-se a ela como brilhante, esperta e estudiosa. Com
um tom intencional de suspense em sua voz pergunta: Onde vocês acham que ela
está agora? Todos pensamos que a brilhante aluna havia sido contratada pela
universidade, tinha seu próprio laboratório e que essa era a moral da história:
estudem e terão o que merecem. Provocando espanto e decepção em todos ele diz:
- Ela provavelmente está inventando algo novo para brincar com seus filhos,
fazendo supermercado ou escolhendo cuidadosamente o livro infantil para ser
lido a noite.
Ele conseguiu, nos 15 minutos seguintes, nos convencer de que todo o
brilhantismo de sua aluna durante o doutorado não foi em vão. De que
conhecimento adquirido nunca é perdido e será sempre aplicado de alguma forma.
De que nossa cara de decepção é completamente inapropriada uma vez que sua
aluna fez bem o que se propôs a fazer e agora exerce uma outra tarefa ( ser mãe
e cuidar de sua casa) com a mesma dedicação e empenho. De que caminhos existem,
outros, e correm em paralelo e basta apenas um pouco de coragem e um pulo para
mudar de rota, sem perder o que já foi caminhado.
Espantou-me a lucidez daquele professor. A astúcia de nos mostrar
que, mesmo sendo exigidos ao extremo naquela disciplina, as horas de estudo não
seriam em vão, fosse lá o caminho seguido dalí pra frente. Sabia ele que cada
um de nós, com planos de correr por trilhas tão diferentes, tinha uma
habilidade a ser descoberta, um sonho a ser perseguido. Tudo que ele queria era
nos convencer de que sua disciplina “sinapses”, nos enriqueceria, independente
dos desfechos de cada um .
Como ele mesmo disse: Sua aluna deixou uma brilhante carreira de
lado, para seguir outra, igualmente brilhante, ser mãe de meninos sortudos. (
pela mãe que tinham)
Pra lá ou pra cá. Mudança para se fazer o que quer é muito bom.
Fazer com habilidade e presteza. Descobrir, dentro e fora da maternidade, o que
deseja.
A maternidade em si exige sua posição na lista de prioridades, mas a
ordem dentre os primeiros da lista não é imutável. Infelizmente, é inegável,
quando um sobe o outro desce e vamos fazendo esse jogo, tentando da melhor
forma possível ordenar maternidade, vida profissional e o sonho guardado
quietinho.
Que em 2013 possamos dar muitos pulinhos de lá pra cá, caminhando
cada estrada com carinho. E que o sonho, qualquer que seja, possa se fazer ouvir
e quem sabe pular mais alto para o topo da lista por algum tempo.
Um saltitante ano para todos!
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