Para mães divertidas, seguras, criativas, cheias de atitudes, atletas, donas de si, firmes, corretas e também para as mães que, como eu, não são tanto, mas são boas, intencionalmente boas mães.

quarta-feira, 27 de maio de 2015

"Eu vou contar uma histórias agora, atenção..."

Ou: Mar de histórias.

Tem um mundo de coisas acontecendo o tempo todo. Porém,  precisamos parar um pouco para percebê-las. No turbilhão da vida atropelamos as histórias alheias e nem nos damos conta de escutá-las.  Mas hoje eu escutei as histórias a mim contadas. Cheguei a absorver parte do sofrimento da voz embargada e a sentir as alegrias vividas.

É bom escutar histórias. Se a nós não trouxer nenhum ensinamento, pelo menos para quem contou traz satisfação. Hoje eu escutei e me emocionei. Também aprendi coisas novas e relembrei que a vida prega peças e é, antes de tudo, efêmera.

Sentada tomando um suco de laranja em padaria na correria da manhã, consenti que sentasse ao meu lado uma senhora. Foi quando comecei a escutar...

Escutei e aprendi que existe um povoado chamado Mal Cozinhado. Fica no município de Horizonte. Lá foi construída uma escola com ajuda da iniciativa privada. O prefeito colocou-a para funcionar e a Sociedade Amigas do Livro (SAL) montou uma linda biblioteca.

Aproveitei para descobrir que a SAL existe há mais de 50 anos. É formada por um grupo de mulheres que promovem ações que valorizam a cultura e a leitura. Já montaram muitas bibliotecas pelo Ceará, favorecendo centenas de adultos e crianças que normalmente teriam acesso restrito a livros.

E por falar em levar livros a quem precisa... Lá na escola de Mal Cozinhado, a prefeitura contratou um bibliotecário.  Um senhor morador da região, bibliotecário já aposentado mas que nunca deixou de espalhar livros e cultura por aí. Levava seu baú cheio de livros na garupa da bicicleta e distribuía nas casas do povoado. Gente que não tinha água encanada nem certeza de inverno, mas tinha livros.

Em agradecimento a conversa, dei um exemplar do cordel “O dotô e o caroço” que meu marido escreveu contando sua história durante a luta contra o linfoma. Ela solidarizou-se e entristeceu. Ajeitei-me na cadeira e fiquei atenta para mais uma história que viria.

Eram mais de 50 anos de casado dos quais ela falava com muito carinho. Porém o marido já vinha há algum tempo apresentando limitações físicas decorrentes de um AVC. Tentavam tirar de letra. Sessões de fisioterapia frequentes, contato próximo com os amigos e uma esposa dedicada eram remédios eficazes. Mas como eu disse antes, a vida prega peças. O marido dessa senhora cheia de histórias para contar tinha recebido recentemente diagnóstico de demência. A rotina da casa estava virando de pernas pro ar.

Essa história caiu pesada em meus ombros. Mas, de alguma forma, ouvi-la pareceu aliviar o sofrimento de minha mais nova amiga.  Foi então que ela sugeriu: vamos comer um bolo?
Meu ar desconfiado a fez explicar a proposta inusitada. Ela contou-me (mais uma história) que quando era criança e algo de ruim acontecia, sua avó a consolava oferecendo com carinho um pedaço de bolo e um pouco de café. Desde então, o bolo é terapêutico.

Escutei e agora conto para vocês essas histórias. Estou ansiosa para descobrir mais sobre o bibliotecário de Mal Cozinhado e contar aos meus filhos sobre o baú de livros na garupa da bicicleta. Contarei também que só soube desta história por que escutei, e saber escutar é uma qualidade que desenvolvemos e devemos cultivar.

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